Apeteceu-me

Ontem decidi sair à rua. Passear. Observar.
Grande parte das pessoas desconhece o meu "problema" com grandes multidões.
Não é nada de grave ou incontrolável, apenas não gosto.

Fui passeando pela Baixa e apenas caminhando, observando tudo em meu redor,
os turistas, os miúdos da escola e as suas modas, os pedintes, enfim...um pouco de tudo.

Sentei-me numa esplanada bem ao meio da Rua Augusta.
E lá fiquei à espera que alguma alma caridosa se dignasse a perguntar o que gostaria de beber (coisa que em uma hora não aconteceu).
Enquanto esperava, sentado no meu cantinho duas coisas aconteceram que me marcaram de alguma forma.

A primeira:
Estava um senhor sentado ao meu lado a ler muito sossegado a o seu jornal quando , subitamente, um pombo surge. Poisa bem em frente do senhor e apenas esperou.
provavelmente esperava alguma comida ou algo do género sei lá.
Sei apenas que se deu ali um momento precioso.
O contacto visual do homem bem em frente do pombo. Quase que me arriscaria a dizer que tiveram uma simples conversa... e tão bem se entenderam.
O sorriso esboçado pelo homem transmitiu uma calma ternurenta.
Nem sei porque avaliei a situação, apenas sei que gostei.
por mais ridículo que pareça achei por bem partilha-la.




(note-se a expressão do sr, sei que nao se vê muito bem mas... está lá)


A segunda:

Do meu outro lado estavam duas mesas juntas onde conversavam e discutiam os seus assuntos escolares e pessoais um grupo de jovens adolescentes.
discutiam problemas banais, com linguagem e postura próprias da idade.
nada demais mesmo.
passou uma senhora de idade já avançada;
gorro na cabeça, grande casaco que dava a sensação de ser bastante quente (e estava muito bom tempo)
arrastava um saco grande, típico de mendigos...
óbvia escassez de dentes, óculos grossos
enfim, nada de novo infelizmente.

Abordou os jovens de maneira bastante simples
estendeu a mão e nem consegui ouvir bem o que disse.
em breves segundos, uma miúda, a que por acaso estava mais perto, alcançou a algibeira e tirou um euro.
pouso-o na mão da velhota, ao que foi correspondida com um caloroso sorriso.
Ao notarem o simpático sorriso da senhora, todos os outros miúdos levaram as mãos aos bolsos, certamente à procura de alguns trocos para lhe dar.
enquanto isso, a senhora sempre simpática, fechou a mão e gesticulou algo como se pegasse suavemente um beijo dos lábios e o mandasse gentilmente para cada um dos miúdos.
Fe-lo repetidamente a cada um em singular.
tudo isso me surpreendeu...
mas ainda mais o que me surpreendeu foi o facto da senhora, após ter "dado beijos" a cada um dos adolescentes, se virou e calmamente seguiu o seu caminho
sem sequer esperar que os restantes garotos lhe pudessem dar as "esmolas" que tinham tirado dos bolsos.
Não acredito que a senhora não tenha reparado pois os movimentos deles eram óbvios.

Achei todos estes gestos num só acto lindo e caloroso.
Só os quis partilhar com queira ler.

Pensei para mim mesmo:
O Mundo está uma merda...
mas não tanto assim...



Será?


6 comentários:

Azul disse...

Olá Moon T!

Não pude deixar de esboçar um sorriso com este teu texto.

é de uma imensa ternura e uma prova viva de que ainda existem pessoas que estão atentas aos outros e que um simples gesto pode fazer toda a diferença na vida dessas pessoas.

aplaudo de pé!

Beijo
Azul

Pax disse...

Eu acho fantástico como um olhar, um toque, um sorriso podem transmitir o que uma vida inteira de palavras nem sempre faz...

Conseguem, ainda que só ocasionalmente, fazer-nos sentir "humanos".

Beijos :)

A Silenciosa disse...

Eu em vez de sorrir, chorei.
Mas sou eu, criatura de choro fácil.
Um momento fascinante para quem "olha com olhos de ver"

Obrigado pela partilha

Léa disse...

O mundo pode ser doce e terno...depende apenas dos olhos de quem o vê.
Esses pra mim são momentos mágicos que me fazem muito feliz.
E senti também qualquer coisa de magia nesse seu texto.

Beijos.

Freyja disse...

Caro Moon_T,

Tu ainda não sabes, mas eu conto!
Acho esses passeios fantásticos e essas "bicas" na esplanada profundamente introspectivas!

Todos os dias me sento numa esplanada com algum tempo com esses mesmos olhos! De manhã, no Cais do Sodré, ou ao pé do trabalho, me dou a esse luxo do Tempo. Acredita que se observa pequenos excertos do comportamento humano naqueles bocadinhos. O Curioso é que também para os meus lados observo essa, ou outra, velhota "mendiga" a pedir, quase todos os dias!
O pior é que raramente vejo essa... bondade, talvez porque os que me rodeiam não são tão novos como os teus comparsas de esplanada desse dia...

E as cenas do pombo... acho o máximo! Mas eu vejo normalmente é gaivotas. Também elas são afoitas ali naquela esplanada!


E se acho que o mundo está perdido? Eu cá acho, mesmo!


Aconselho-te vivamente esses bocadinhos a sós com o mundo. Extraiem-se conclusões muito interessantes á cerca de nós e dos outros...


Beijo e boas bicas,

Selena Sartorelo disse...

Olá Moon,

A delicadeza encontrada aqui faz-me aumentar o gosto que tenho em ler toda a sua diversidade.

Selena